Olá comunidade leitora!
Seria difícil não começar falando sobre aquilo que mais amamos: OS LIVROS. Nessa primeira edição da newsletter da Bodega Literária você irá encontrar:
um texto sobre Jorge Luis Borges e sua paixão por livros;
os lidos no mês de maio;
uma playlist especial baseada em Jorge Amado e
um artigo sobre letramento literário na formação do leitor.
Boa leitura!
Lendo para Borges
Ler para mim é como uma âncora, mas não no sentido de estacionar, de estar parado ou querer ficar parado, pelo contrário. Aqui falo em âncora no sentido de sentir segurança, no sentido de ter onde se agarrar, onde, em meio a tempestade, sentir a segurança necessária para saber que durante e após a tormenta estarei seguro e salvo desse mundo tão veloz, tão competitivo, tão cruel. Por isso digo que ler é como uma âncora, pois é sempre nos momentos de tempestade da minha vida que sinto que a leitura é a única coisa que me faz sentir segurança, que me faz sentir esperança, pois é quando leio que sinto que posso fugir, que posso ir para outros mundos, conhecer outras pessoas, conhecer histórias que me emocionem ou que me toquem, a magia que me faça fugir dos meus medos, das minhas inseguranças, das minhas tristezas e que me faça, por pouco tempo que seja, me sentir outro, mais forte, mais ancorado.
Acabei de ler o livro “Com Borges”1 de Alberto Manguel, autor argentino que nunca havia lido, mas que durante um insight para a criação dessa primeira edição da newsletter da Bodega Literária me veio a chance de lê-lo para saber sobre o que eu poderia falar com vocês. Nesse livro, que é bem curtinho e pertence a editora Âyiné, Manguel, com apenas 16 anos, passa a frequentar a casa de Jorge Luis Borges onde torna-se um dos vários estudantes da época que lê para o autor durante o seu período de velhice, já no acometimento de sua cegueira. Acompanhar Manguel narrar sobre sua relação com Borges é acompanhar a paixão que ele mesmo observa no autor sobre o seu relacionamento com os livros. No livro sentimos essa paixão que Borges sentia com a literatura, com o livro físico em si, mas principalmente sobre o hábito de falar sobre o que lia, sobre o que sentia quando acabava um livro e precisava falar sobre ele com seus companheiros ou através de seus próprios escritos. Não é a toa que seu ramo literário é exatamente a literatura que fala sobre a literatura. Com isso, me senti sentimentalista ao ponto de me recordar das primeiras vezes que falei sobre livros nos meios digitais e como foi bom saber que havia outros tantos que também falavam sobre livros pela internet.
“Às vezes, ele mesmo escolhe um livro nas prateleiras. Sabe, claro, onde cada volume está guardado e vai até ele infalivelmente. Porém às vezes ele se encontra num lugar em que as prateleiras não lhe são familiares, numa livraria por exemplo, e é então que acontece algo misterioso. Borges passa as mãos nas lombadas dos livros como se estivesse tateando a superfície rugosa de um mapa em alto-relevo e, mesmo não conhecendo o território, sua pele parece ler a geografia. Ao passar os dedos em livros que nunca abriu antes, algo como uma intuição de artesão lhe revela o que está tocando, e ele consegue decifrar títulos e nomes que certamente não consegue ler.”
Enquanto leio a graciosa relação de Borges com seus livros, lembro de como foi o meu processo de começar a ler: A insistência com minha mãe para que ela me ajudasse a me alfabetizar, os pequenos livros que ela me dava de presente contendo fábulas ou contos de fadas, os livros de colorir que me incentivavam a abrir a imaginação, a minha primeira ida a biblioteca pública para fazer uma ficha de empréstimo, meu primeiro livro comprado com dinheiro próprio e a crescente biblioteca com o passar dos anos. Há um fato curioso em sem leitor, que é exatamente essa vaidade no fato de ler, de ter livros, de falar sobre livros, que nos inflama o ego e faz da nossa biblioteca o nosso tesouro e ao mesmo tempo a nossa identidade. Para o próprio Borges a biblioteca de cada indivíduo é como a identidade de como ele seja, a sua própria autobiografia. Poderíamos criar isso, não? Essa realização da identidade do leitor através do conhecimento de sua própria biblioteca.
Ler Manguel na suas aventuras como leitor para Borges, que tanta amava os livros e a literatura, é como eu me sinto quando falo de livros para a comunidade leitora: O grande aspecto do compartilhamento da sensação de um livro lido, os sentimentos criados pelo tato das páginas contra a pele, o cheiro de papel que entra pelas narinas e que desperta memórias, as palavras que, juntas em seu emaranhado labiríntico, formam a teia das conexões. De forma geral, a magia da leitura que transforma o humano. Não há como desvincular a paixão pelos livros da paixão de falar sobre livros, tanto que o próprio Borges dizia:
“Para Borges, o âmago da realidade estava nos livros: em ler livros, escrever livros, conversar sobre livros. De maneira visceral, ele sabia que dava continuidade a um diálogo iniciado havia milhares de anos, o qual ele acreditava que nunca terminaria. Livros restauravam o passado.”
Em "Com Borges", somos conduzidos a compreender como a leitura pode transformar nossa visão de mundo, despertar nossa imaginação e nos conectar com a riqueza da experiência humana. Manguel nos mostra que a leitura não é apenas uma atividade passiva, mas sim um diálogo entre o autor e o leitor, o texto e o mundo, onde as palavras ganham vida e nos transportam para outras realidades. Ao mergulhar nas páginas de um livro, nos tornamos exploradores, desvendando tesouros escondidos, enfrentando desafios e vivendo aventuras que expandem nossos horizontes. Através das palavras de Manguel e da inspiração de Borges, compreendemos que a leitura é um ato de descoberta, autoconhecimento e ampliação de perspectivas. Ela nos convida a questionar o mundo ao nosso redor, a refletir sobre questões fundamentais da existência e a explorar a complexidade da condição humana. O livro "Com Borges" nos lembra que a leitura não é apenas um entretenimento, mas sim uma fonte inesgotável de aprendizado, crescimento pessoal e transformação. É um convite para nos perdermos nas páginas dos livros e, ao mesmo tempo, nos encontrarmos em suas histórias. É uma lembrança de que a leitura é uma janela para a compreensão do mundo e para a ampliação de nossa própria humanidade.
Lidos do mês: Maio
Essas foram as leituras realizadas durante o mês de maio. Fantasia, contos argentinos e até um romance que mescla personagens contemporâneos com Virgínia Woolf. Segue abaixo a lista:
"As Horas" de Michael Cunningham - é uma obra que entrelaça as histórias de três mulheres de diferentes épocas, mostrando como a vida e a obra de Virginia Woolf influenciam suas trajetórias.
"Luneta Âmbar" de Phillip Pullman - é o terceiro livro da trilogia "Fronteiras do Universo", apresentando uma história envolvente e repleta de aventuras em universos paralelos.
"As Armas Secretas" de Julio Cortázar - é uma coletânea de contos que exploram temas como o surrealismo e a fantasia, levando o leitor a refletir sobre a natureza da realidade e as relações humanas.
Clicando nos links você tem acesso as resenhas direto da página do instagram da Bodega Literária. Não deixe de conferir.
Literatura Sonora #01: A Bahia de Jorge Amado e de hoje.
Para abrir as indicações de conteúdos extra livros aqui na Bodega Literária convidei o George Domingos2 da página Outras Mumunhas Mais, onde a cada edição ele vai nos indicar músicas que compõem também um dos muitos universos que nos levam a imergir, assim como os livros, na imaginação poética de seus compositores e interpretes. Dessa vez a temática é sobre Jorge Amado, nosso autor xodózinho. A seguir, confira essa playlist baiana inspirada no imaginário amadiano, onde cada faixa é uma janela para um universo único, repleto de tradições, religiosidade e o rico patrimônio cultural da Bahia.
Em “O bem do Mar”(1) de Dorival Caymmi, somos levados a contemplar a vida do pescador, que encontra na imensidão do mar sua fonte de sustento e, ao mesmo tempo, um espaço sagrado que o inspira à sua religiosidade. Já em “Notícias de Salvador” (2), mesmo estando longe da cidade, Luedji Luna mantém um vínculo profundo com sua religiosidade, especialmente com o Senhor do Bonfim, que permanece como um farol de fé em sua vida.
“Tradição”(3) de Gilberto Gil nos leva a explorar a vida urbana de Salvador, abordando também questões raciais. A música revela o ambiente vibrante e diversificado da cidade, e ainda faz uma sutil abordagem da sexualidade fluída, trazendo à tona a riqueza da diversidade humana. Em contrapartida, “Miçanga”(4) de BaianaSystem nos encanta com sua melodia que remete ao cancioneiro popular, ao mesmo tempo que evoca elementos praieiros que evocam o espírito de Caymmi.
Em “Trilhos Urbanos”(5) de Caetano Veloso, somos transportados para Santo Amaro da Purificação, uma cidade do interior repleta de camadas de história. Até mesmo um fato curioso, como o lugar onde o Imperador fez xixi, é transformado ironicamente em um fato histórico digno de nota. “Salcity”(6) de Tícia, por sua vez, nos leva a um passeio pela Salvador contemporânea, com sua atmosfera vibrante e suas críticas sociais, buscando retratar as vozes das minorias presentes nas suas letras.
“Milagre do Povo”(7) na voz da saudosa Gal Costa é uma homenagem a Jorge Amado, onde somos imersos no universo religioso e na fé contagiante da Bahia, que inspirou muitas de suas obras. Já em “Sem Sol”(8) de Russo Passapusso e Anelis Assumpção, a música contemporânea encontra seu lugar no imaginário retratado por Jorge e Caymmi, trazendo uma fusão entre o passado e o presente.
“Chorojô”(9), clássico dos Tincõas, nos conduz à religiosidade afro presente no universo amadiano, além do próprio grupo representar o Recôncavo baiano vivo e contagiante. E, por fim, “Ifá, canto pra subir”(10) de Margareth Menezes, que também exalta a fé no Senhor do Bonfim, envolvendo-nos em uma atmosfera espiritual e mística.
Essas músicas, com suas letras cuidadosamente elaboradas e melodias envolventes, diversificada no seu clássico e no seu contemporâneo, nos transportam para os cenários e temas abordados por grandes nomes da música baiana. Para ouvir a playlist completa use o player abaixo ou acesse esse link aqui.
Ps: Lembrando que na página do instagram da Bodega Literária você encontra um diário de leitura dos livros de Jorge Amado em ordem cronológica. Confere aqui.
Epi logo existo: O diário de um estudante.
Não é de hoje que sempre fui mexido com a vontade de cursar licenciatura em Letras. Por volta de 2016 ainda fiz matrícula num ano letivo, mas os vai-e-vens da vida (e aqui leia-se o custo que é a vida de ser estudante num curso em outra cidade) não deixaram que eu pudesse acompanhar a faculdade. Mas a vontade nunca sumiu. Só agora em 2023, com a oportunidade da licenciatura a distância ofertado pela Universidade de Pernambuco (UPE), foi que enfim arregacei as mangas e entrei com toda vontade no curso de Letras - Português. Nas próximas edições reservarei esse espaço para falar um pouco mais sobre meu cotidiano como estudante num mundo pelo qual sou apaixonado (e que me pergunto se continuarei apaixonado depois de quatro anos) que é a literatura.
Com as aulas iniciadas em março desse ano, posso dizer que ainda nem entrei verdadeiramente no curso, uma vez que o primeiro semestre conta apenas com disciplinas para situar o aluno no campo cientifico, metodológico, mas que ainda assim já fala sobre temas como “o que é texto”, bases curriculares e letramento. Sobre esse último assunto, produzi um trabalho sobre a importância do letramento para o indivíduo e como alguns autores abordam essa temática. Deixo logo abaixo o link para o artigo na minha página do Médium.
Leiam aqui: Artigo: Leitura, Texto e Sentido
Por hoje é só! Essas foram algumas das indicações e brisas da vez. No próximo mês outra edição com mais conteúdo sobre o universo literário e seus afins, ou… pode rolar alguma edição bônus quando menos você esperar.
Abraços,
Bodega Literária.
George Domingos é Arquiteto, alagoano e apaixonado por música. Criador do perfil “Outras Mumunhas Mais” no instagram, página que fala, de uma forma bem divertida, sobre o universo musical brasileiro.